Texto de Estudo

Efésios 4:20:

20 Mas vós não aprendestes assim a Cristo,

 

INTRODUÇÃO

A oportunidade de repensar “quem somos” e “porque somos o que somos” é algo que não podemos deixar escapar. A resposta que dermos a estas perguntas nos proporcionará uma visão panorâmica da vida e do momento exato desta vida que estamos vivendo. Pois, há momentos em que nos deparamos com confusos e difíceis trechos da jornada de nossas vidas, gerando frustração e esgotamento. As coisas não se encaixam e ficamos com aquela sensação de uma vida sem propósito. Saber exatamente quem você é ajudará a compreender o porquê você age do jeito que age. 

Em Efésios 4:1 é exatamente isso que Paulo faz. Ou seja, faz aqueles cristãos refletirem na questão mais elementar de todas. Seu apelo traz uma carga considerável de emoção. Ele diz “Rogo-vos... que andeis de modo digno de vossa vocação”. Nosso texto está dentro de um contexto maior da carta, onde Paulo começou falando de nossa vocação. A tal “vocação” refere-se à identidade do cristão. Há um chamado para todos nós. E este chamado se estende por dimensões variadas, que muitas vezes são ignoradas por nós. Este chamado tem como precedente mais remoto o próprio chamado de Abrão (Gênesis 12:1-3). Fomos chamados para ser uma bênção para as pessoas. Isso aponta para nossa missão, mas também aponta para nossa identificação (quem somos). A lição de hoje nos mostrará que a maneira de viver do cristão é diferente. E esta diferença está baseada naquilo que Jesus fez e ensinou. Também nos mostrará que um viver santo é resultado tanto da graça de Deus como de nossas decisões.

 

A VIDA ANTES DA RENOVAÇÃO

O verso 20 está diretamente amarrado aos versos 17 à 19. Aliás, o verso 20 é a contrapartida das ideias expostas nos versos anteriores. E de que falavam estes versos anteriores? Falavam de um estilo de vida devasso, fútil e sem temor a Deus. Paulo toma por base a vida de uma forma geral em sua época. O contato contínuo com a cultura não judaica deu a Paulo um pano de fundo amplo, o que contribuiu para a fundamentação de suas exortações. 

De acordo com Paulo, a forma de vida das pessoas em geral naquela época era caracterizada pela “vaidade dos próprios pensamentos” (v.17). Ele não nos deu detalhes destes pensamentos. Mas acredito que o que encontramos em Romanos 1 dá-nos uma referência. E a razão para que tais pensamentos fossem vaidosos era consequência de um “obscurecimento de entendimento”. Em outras palavras, Paulo afirma que o que o ser humano faz é resultado daquilo que ele pensa. Este estilo de vida é “alheio à vida de Deus”. Ou seja, a vida que se deriva de Deus (ou dada por Deus) é marcada por uma nova ética, fruto de um novo entendimento. 

Paulo prossegue em seu argumento dizendo que a ignorância e a dureza de coração que caracterizavam a vida da população em geral tornavam as pessoas insensíveis. Taylor diz: “Insensibilidade moral significa cinismo, descaramento, arrogância diante de Deus e dos homens, e vida sem a restrição da consciência. O resultado final é irresponsabilidade moral, na qual o pecado corre desenfreado pela vida”. 

Essa insensibilidade colaborava também para uma não aceitação racional da mensagem da Cruz e o que dela se desencadeava, levando o indivíduo a um comportamento imoral e amoral (se é que assim podemos supor). Em vez de serem tratadas como vítimas as pessoas “alheias a Deus” são responsáveis pelo estilo de vida assumido. Portanto, o “mundo” em que estavam inseridos aqueles cristãos era resultado da forma de racionalizar (de pensar) e da forma de agir daquela geração. Em uma época bem anterior a época de Paulo um salmista já questionava: “Ora, destruídos os fundamentos, que poderá fazer o justo?” (Salmos 11:3). Arrisco dizer que a reposta do apóstolo Paulo para uma pergunta como essa seria: ‘viva como um novo homem!’. Que novo homem seria esse? Estaria Paulo falando de uma pessoa de uma região tão distante do mundo que nem judeus, nem gregos, romanos, bárbaros soubessem quem era? Não. O foco de Paulo não é étnico. Embora, nesta sua carta estejam claramente traçados os contrastes entre judeus e gentios. O novo homem ao qual Paulo se refere é aquele nascido em Cristo. E tem sua cidadania radicada num Reino não estabelecido por mãos humanas. Ele diz: “... [Jesus] aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si, um novo homem, fazendo a paz” (Efésios 2:15). Sem sombra de dúvidas isso lançava para longe qualquer etnocentrismo. Apesar de ser judeu, Jesus veio para qualquer homem e qualquer mulher de qualquer nação. O Evangelho pregado por Jesus e seus discípulos era e é o Evangelho todo, para o Homem todo e todo Homem.  

 

A VIDA DEPOIS DA RENOVAÇÃO 

No conceito paulino, e bíblico, aprender Cristo é muito mais que aprender sobre Cristo. Os efésios não só haviam recebido um corpo de doutrina, isto é, sobre Cristo, e nem só haviam observado na vida daqueles que exibiram o que esta doutrina era capaz de realizar, mas, além disso, eles mesmos, por um ato de fé operado pelo Espírito, haviam recebido esse Cristo no coração deles. Foi com alegria que receberam o batismo. E por meio de uma constante e sistemática participação dos meios de graça, por meio da oração e das respostas a ela, por meio do viver diário de conformidade com os princípios da verdade do Evangelho, eles haviam aprendido Cristo, sim, Cristo pessoalmente. Paulo apresenta a apropriação de Cristo e da salvação nele como o resultado de um processo de aprendizagem, uma aprendizagem que envolve coração e mente. Os cristãos, em outras palavras, não são salvos de um só golpe. Não são completamente transformados de uma só vez. Eles aprendem. Houve uma transformação básica operada pelo poder Deus. Isso foi seguido por um constante progresso em santificação; constante, sim, porém não necessariamente uniforme. Numa pessoa isso é mais claramente marcante do que noutra. Em alguns casos, o progresso é quase de um salto, enquanto que noutros é a passos de tartaruga. Às vezes, com toda probabilidade é seguida de reveses e retrocessos. Entretanto, o ponto enfatizado pelo apóstolo é que qualquer que tenha sido o grau de avanço na aprendizagem, definitivamente não aprenderam Cristo como um defensor do pecado e egoísmo da lascívia e da licenciosidade. Suas mentes não mais geravam futilidade, nem seu entendimento era entenebrecido. 

Quando se ouve a pregação do Evangelho ou da Palavra de Deus em sua integralidade, o ouvinte é chamado a tomar uma decisão que na realidade implica em duas. Primeiro, se decide deixar para trás a vida que antes não tinha aliança com Deus. Nesse momento o tal ouvinte começa a entender, progressivamente, que ele já é um cristão, mas tem que passar a sê-lo todos os dias de sua vida. Isto é, num primeiro ato há rejeição ao mundo, o que chamamos de conversão. E num outro ato assumimos o discipulado. É por isso que afirmo que toda evangelização que não desemboca num discipulado é um evangelismo incompleto. Somos acalentados pela ideia de que o que nos basta é pregar para alguém. Uma vez obtido sucesso, o que temos de fazer depois é trazê-lo para a igreja e pronto. Todavia, o cristão não tem uma responsabilidade não apenas com a igreja, para com os da fé, o novo convertido (e os convertidos a mais a mais tempo também) tem uma tarefa a cumprir perante a esfera pública também! É aqui que se encaixa bem a diversidade de dons. Nossa missão não é preparar pessoas para apenas frequentar o nosso local de adoração, cantar nossos hinos e com tempo adquirir nosso jeito comum de ser. Deixado apenas no âmbito da esfera eclesiástica este “bebê espiritual” não terá uma gestação completa, e, portanto não saudável.  

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Quando Paulo exorta aqueles cristãos a despojar-se do velho homem, que inclusive está em estado de decomposição, e se revestir do novo é porque sabia do impacto positivo que um comportamento cristão genuíno geraria num mundo de escuridão e trevas espirituais. Pelo que me lembro, nos áureos dias de expansão da Igreja Primitiva (Atos dos Apóstolos 2), os que creram contavam com a simpatia daqueles que eram de fora da comunidade de discípulos e não o contrário. Do mesmo modo devemos proceder hoje. A literatura bíblica gosta muito de usar a figura de vestimentas para falar da vida moral ou do caráter das pessoas. E é isso mesmo que Paulo intenciona elucidar aqui. 

Outra coisa importante que não podemos deixar de aprender aqui é o que Paulo diz nos versos 21 e 22. O grande missionário de Tarso apontou para o fundamento da ética do Cristão. O cristão não oferece ao mundo aquele que vem de si, mas aquilo que é dado por Deus. Por isso, que são poderosamente impactantes as palavras de Paulo em Efésio 2:9-10: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois, somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas”. Nenhum de nós teria capacidade para resplandecer como luzeiros num mundo em tão densas trevas. A ética cristã vem daquilo que foi vivenciado e ensinado por Jesus. É isso que está por trás das frases “não foi assim que aprendestes a Cristo” (v.20) e “nele fostes instruídos, segundo é a verdade em Jesus” (v.21). Isso significa que tanto deve haver uma aceitação da pessoa de Jesus como salvador, quanto como de legislador. A verdade em Jesus era o fato de que aquele Jesus histórico era o messias esperado. Paulo relaciona a profecia com seu cumprimento. Mas Jesus não era apenas uma profecia. Era uma pessoa. Por isso é preciso se relacionar com Ele, e não apenas obter informações a respeito dele. Hernandes Dais Lopes foi feliz quando afirmou: “Aprender com Cristo representa ter um estreito relacionamento com ele. Aprender sobre Cristo e ter informações sobre ele. Uma pessoa pode conhecer sobre Cristo e não ser salva. Posso aprender sobre Rui Barbosa porque tenho livros sobre sua vida, mas jamais posso aprender a Rui Barbosa, porque ele está morto. Jesus Cristo está vivo. Portanto, posso aprender com Cristo” .

Paulo não dá detalhes do conteúdo do que eles deveriam ter aprendido. Mas, a deduzir pelo contexto mais amplo de Efésios 4:17 até 5:20, possivelmente fossem ensinamentos relacionados ao bom comportamento que o cristão deveria praticar. Por mais tardios que os discípulos tenham sido em entender tudo o que Jesus tinhas lhes dito, o tempo deu provas de que tais ensinamentos ficaram gravados de formas profundas na mente e na vida daqueles representantes do Reino dos Céus. Não somente Paulo, mas Lucas tinha em mente uma espécie de sumário daquilo que havia aprendido. Lucas disse a Teófilo: “Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar” (Atos dos Apóstolos 1:1; grifo nosso). 

Jesus foi sem sombra de dúvidas aquele que vivia o que pregava para pregar o que vivia. Paulo ainda chega a questionar aqueles irmãos e irmãs de Éfeso se realmente tinham ouvido e tinham sido instruídos na verdade em Jesus (v. 22). Possivelmente o que estava por trás destas palavras fosse o fato de terem existido muitos falsos mestres e enganavam os irmãos e os incitava contra Paulo. Ou talvez, Paulo estivesse apenas fazendo um comparativo entre o que aqueles cristãos estavam vivendo e o que lhes foi ensinado. Logo, a doutrina não estava batendo com a prática. 

Duas coisas importantes devem ser ressaltadas aqui. Primeiro, a vida cristã ou vida discipular não é destituída de fundamento doutrinário. A redenção acarreta em instrução. Lembre-se de que primeiro Deus tirou o povo de Israel do Egito, depois lhes deu a Lei para nela pudessem andar. Para sermos sal e luz neste mundo precisamos entender o que cremos para então conclamar aos outros que creiam. Em segundo lugar, vejo que o simples fato de o discípulo e discípula estarem inteirados das doutrinas cristãs nãos os fazem agentes de mudanças. É preciso que sua doutrina, aquilo em que crê, esteja entranhada em suas ações. Somente assim sinalizaremos aos que estão a nossa volta que o Reino de Deus já veio e está presente em minha maneira de ser.  

 

VIDA RENOVADA E SEMPRE SE RENOVANDO

Os versos 23 e 24 revelam-nos que um discípulo(a) de Jesus não nasce pronto. Depois da conversão há um processo que precisa se desenrolar. Pelo menos esta é a linha que sigo quanto à compreensão deste texto. Ou seja, o discípulo(a) entra na fase de maturação. É aqui que o velho padrão de vida vai sendo abandonado. O velho Homem vai ficando para trás e o novo Homem ganha cada vez mais espaço. Mas não pense você que o velho Homem bate em retirada facilmente. Há uma luta renhida entre as duas naturezas. Não me pergunte em quanto tempo o velho Homem ficará fraquíssimo. Isso dependerá da busca de cada um em conhecer e obedecer a Deus.

Essa é a prova de que ainda não somos tudo aquilo que fomos chamados para ser. Estamos caminhando em direção a plenitude. A obra graciosa de Deus está em ter nos vivificado quando ainda estávamos mortos em delitos e pecados (Efésios 2). Após o parto, somos apenas um bebê espiritual. Teremos uma vida cristã a desenvolver. No entendimento de Paulo, o crescimento espiritual passa pelo progresso do conhecimento da verdade. A justiça e a retidão procedem da verdade (v. 24). A doutrina de Cristo e dos apóstolos é o nutriente de que precisamos. 

Tornar-se cristão envolve uma mudança radical (4:22- 24). Envolve o repúdio do nosso próprio “eu” antigo, da nossa humanidade caída, e a adoção de um novo “eu” ou da humanidade criada de novo. Veja o contraste entre os dois homens, o velho se corrompe, o novo é criado segundo Deus; o velho era dominado por paixões descontroladas, o novo foi criado em justiça e santidade; os desejos do velho eram do engano, a justiça do novo é da verdade. O pagão se corrompe por causa da futilidade de sua mente. O cristão se renova por causa da renovação de sua mente. Tornar-se cristão envolve tirar as vestes da sepultura e vestir-se de novas roupagens. Lázaro esteve na sepultura por quatro dias. Cristo ressuscitou-o, e Lázaro levantou- se do sepulcro, mas coberto da mortalha. Cristo ordenou: “Desatai-o e deixai-o ir”. Devemos também, da mesma forma, tirar as roupagens do velho homem e revestir-nos das roupagens do novo homem. 

Por isso ordena: “vos renoveis” e “vos revistais”. O verbo conjugado “vos renoveis” está na voz passiva. Ou seja, o discípulo deve buscar esta renovação, mas quem concede o poder para tal coisa é somente Deus. Por isso que todos os que se aproximam de Deus, deve fazê-lo com humildade e espírito quebrantado. Em suma, ama vez vida nova sempre se renovando. Este deve ser nosso lema. Por enquanto, somos o que somos em parte. Mas um dia seremos como ele é, perfeitos! 

 

CONCLUSÃO

Mais do que nunca o mundo precisa ver a luz da verdade que brilha em nós. Tendo em vista que tantos percalços se interpõem entre Deus e os Homens, o bom testemunho dos discípulos e discípulas do Senhor alcançará não somente o favor de Deus, mas também o favor dos Homens. Pergunte a si mesmo quem você é. Todavia, lembre-se de que para obter esta resposta você precisa responder a outra pergunta: ‘Quem é Jesus?’. E porque preciso saber quem sou? Para que saibas o que deves fazer, e como deve fazer. Você foi chamado por Cristo para ser uma boa influência no mundo. Viva o cristianismo, viva o novo! 

 

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